domingo, 3 de julho de 2011

estonteante

ela o mandou embora. "não vai acontecer mais nada, acho melhor você ir mesmo.."
" o que?"
.
"é isso?"
se levantou com impulso brabo de quem está sem entender. assim como ela, que permaneceu deitada de costas para ele, quieta, serena, derramando uma lágrima absorvida pelo travesseiro. procurou suas roupas. ela levantou e foi até a sala. enquanto ela se vestia ao lado da estante de livros, ele procurava sua calça debaixo da cama.
se encontraram e ela evitou o seu olhar. pegou suas pantufas, pediu desculpas por fazê-lo ir embora tão tarde.
"pegou suas chaves?"
"aham"
desceram, ela precisa abrir os portões para oficializar a saída.
"desculpa, eu tô passando por um momento confuso e não acho justo que você participe."
"tudo bem.. eu só queria entender o que aconteceu"
a expressão na face do rapaz era de desavença. não entendia, se revoltava, mas seus olhos amendoados ficavam mais brilhosos quando se deparava com a confusão da moça.
"não quer falar?"
com uma lágrima sendo formada "não".

"tá bom". deu um beijo em sua testa, outro na face. e foi.

ela voltou chorando, entrou em casa e o choro veio acompanhado de gemidos. sentou, chorou. levantou, andou, sentiu frio e calor e não entendia porque tinha feito aquilo.

recapitulou a noite. transmissão de pensamento e ele veio buscar um objeto que havia esquecido. algum papo e saíram em busca do vinho. voltaram, viram um filme, ele não prestou atenção. ela pôs os óculos, ele disse que ela lembrava uma antiga amiga dele. ela não gostou.
ela prestava a atenção nos detalhes do filme, ele ficava olhando pra ela e dizendo que ela estava distante.
ele disse que não estava entendendo o filme e que não gostava de gays. ela achou um absurdo, mas sorriu e disfarçou. tirou o filme, pegou uma pizza e colocou outro filme.
os dois viram o filme comendo, se abraçando.
ele tentou uma vez e ela disse que era preciso ter clima. ele esperou, parecia acompanhar o ritmo errante da moça.
o filme acabou, os dois se entrelaçaram e ela parecia estar, então, no clima.
fizeram o que puderam para que ela entrasse em seu ápice e logo, quando a preguiça bateu, ela disse "saí do clima.."

aí o desentendimento começou. desencontros em um cômodo. em uma peça. em uma cama, sob o mesmo lençol.
tão perto, mas tão longe um do outro. ela queria mais cortesia, ele provavelmente menos drama. ela é dez anos mais jovem, mas às vezes a diferença é insignificante.
ela queria que ele fosse algo que ele não é. descontou nele suas frustrações e ideais.

no filme, duas moças partiram para uma viagem de descobertas. ela queria viajar para o mesmo lugar. uma conservadora, descobriu seu lado impositivo e desenfreado. a outra, liberal, soube se ouvir e sentiu que às vezes precisa de uma referência fixa, algo em que ela possa se apoiar.

as duas se descobriram em si, com suas diferenças.
ela achou que conseguisse levar esse envolvimento com leveza, mesmo não sendo de um todo leve. seus pais, ah, seus pais.. o que tem eles?
gaela, aprenda, o desejo é seu. não deles.

um medo tremendo de se envolver e aí não saber se deve ser independente, autônoma. tem sua vida e conquistou seu território. quem ousar ameaçá-lo é posto pra fora.
ela derramava lágrimas no travesseiro e pensava: 'manda ele embora.. não se contenta com isso. você não quer, tenta falar o 'não'. vai, não fica quieta.. não chora, você é a protagonista".

qual é, então, a diferença entre se envolver e se relacionar? até que ponto todas as relações nos capturam e nos exigem sacrifícios? gaela, retire-se. vá pensar. volte e faça o que quer, sabendo o que quer. tanta confusão não dá em nada.

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