segunda-feira, 1 de março de 2010

eu liricando falando na poesia

(...) Cássio* de quê? Cássio, simplesmente Cássio. Não basta?

(...) - Cássio de Tal - ele havia dito -, Mariana de Tal, o resto não interessa. Que mania vocês têm de sobrenome, do de antes do sobrenome, os antepassados importantes, as famílias que vem do tempo do Império, o apartamento na beira do mar, o carrão preto e luzidio com o motorista fardado a abrir a porta aos patrões; isso tudo não passa de perfurmaria e você sabe disso (...).


Simplesmente você. Ás vezes sem lenço, sem documento, sem frescuras, sem reservas, sem vergonhas, sem roupas. Só você. Se pudéssemos colocar cada ser humano lado a lado, cada qual com sua peculiaridade, sem maiores interferências de uma suposta moralidade, estaríamos diante do real espetáculo da vida. Veríamos sorrisos, veríamos o indivíduo em cena, indivíduos juntos que constróem... o que?
Juntos ou separados?
O budismo prega, dentre tantas filosofias interessantes, a arte do desapego material. É evidente que diversas outras doutrinas religiosas e de pensamento convergem no que diz respeito à ocupar-se da espiritualidade como forma de melhorar a qualidade de vida.
Recorrer à filosofia sempre foi um hobbie, e hoje eu peço que parem de rodar o planeta e entendam que só escrevo quando não vivo.
Estou hoje numa fase em que vivo pela metade, e por isto minha escrita não se mostra de qualidade como as demais, mas aqui estou eu, regressando.

Quando estou sem fôlego, quando estou dentro do movimento repetitivo que o mundo proporciona, eu percebo as coisas, eu capto as coisas, eu me transformo nas coisas. Quando a vida passa, eu escrevo. Eu deságuo, eu evacuo os sentimentos que afloraram durante a minha primavera emocional.

Quando me desapego da escrita, sinto que algo falta, que algo se perde. A escrita é, por via das dúvidas, a forma mais certeira de se registrar algo. Mas aí me pego no paradoxo de imaginar a cena de um casal sentado na grama quente do sol com um vento gelado acariciando seus rostos. Eles se abraçam e apreciam a vista.
Isto eu registro em descrição, mas nunca será um registro absoluto, pois o cheiro, o olhar, o toque, todos estes, são transcendentais.
Penso hoje em ti, Cássio, desapegado dos teus costumes, largado dos teus princípios, separado do teu passado. Estás certo de que nada disso voltará? Não te induzo a pensar que desconfio de ti. Jamais, confio como jamais confiei.
Mas te desafio a pensar, em liberdade - a qual combinamos - que penses se o que há é algo que em ti borbulha.

Digo que acho esplêndido o desapego, mas assumo que sou apegada e sou materialista. Não como Freud costumava se auto denominar, ou como pensamos no radicalismo da expressão. Sou zen e constantemente espirituosa. Tenho lá minhas supertições e manias, assim como todos, e torço para que tu, Cássio, descubra-as, comente-as, ame-as.
Torço para que tu te entregues, quero te conhecer por inteiro, quero te roubar do teu corpo, quero te manter leve, quero desbravar todos os mares que um dia se mostrarem turvos.

Só preciso, Cássio, que voltes da Itália e aterrise em terra firme.

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