sexta-feira, 7 de agosto de 2009

Histórias que se mesclam são apenas relações de um mesmo contexto

E assim ele a deixou, em um dia negro com lágrimas pesadas caindo do céu, quando o vento nem soprava a seu favor, tampouco contra. Há dias que ela nota a decência de sua postura frente à uma simpatia que apareceu, podemos dizer, de repente. Pode ser que esta tenha sido intimidada devido a presença de uma sombra possessiva, que sem muitas palavras, tratava de afastar quem fosse que se aproximasse. Ou não. A desenvoltura de suas conversas pode ter se expandido por várias outras razões..que tolice atribuir à isto toda a mudança.


Há de se perguntar porque Sarah insiste em procurar parceiros comprometidos..é evidente que em algum momento eles irão deixá-la. Caso aconteça o oposto, e o marido separar-se da esposa e assumir seu relacionamento com ela, eventualmente Sarah seria feliz por alguns anos. Tempo depois, ela sentiria-se traída, deixada, esquecida. É assim que ela 'funciona': sua máquina emocional, se me permite esta antítese, é programada, desde o nascimento, para ser o centro da vida de alguém. Quando veio ao mundo, sua mãe a olhava como a flor mais bela do jardim, aquela que brilhava e ofuscava a beleza e graciosidade de todas as outras. Era a criança mais saudável do berçário, a mais comportada entre as irmãs, a que melhores notas tirava e enfim, a primogênita. Quando Sarah viu-se em segundo plano, tendo que dividir a atenção e os presentes que antes recebia inteiramente, surtou. Entrou em revolta e melancolia profundas, recusando-se a brincar, comer e conversar. Quem a tirou do escuro foi Bob, um bombeiro que por sorte teve a sensibilidade de procurar dentro do armário por crianças que poderiam ficar para trás na casa que pegava fogo seis meses depois do nascimento de Jena, irmã de Sarah. A casa ficou aos pedaços, como estava antes o coração de Sarah. Quando foi resgatada, sentiu o frescor de respirar ar puro e rever seus pais. Voltou a ser a menina doce e inquieta que era meses antes. Quem escuta este episódio por ora acredita que Sarah não teve problemas com seu posicionamento em suas relações, fossem elas de trabalho ou afetivas. Enganam-se, colegas. Ela encobriu seu lado possessivo e narcísico, deixando que se estabelecesse em sua personalidade aparente os traços de uma jovem absolutamente equilibrada.


Apenas após namoros longos, Sarah tomou-se conta de que aquelas sensações que a atormentavam quando tinha 7 anos de idade voltavam como ondas que após arrebentadas, parecem misturar-se às demais águas, mas que voltam acrescidas de mais volume para uma onda mais forte e arrebatadora. Quando terminou com Charles, seu primeiro namorado de longa data, Sarah viu-se sozinha na sala, sentada no sofá frente a lembranças que não queria mais ter.


Demorou a se apaixonar novamente, mas quando isto aconteceu, foi comedida e se entregou aos poucos, conseguindo a atenção do parceiro até a primeira discussão. Ela era misteriosa, envolvente, completamente duas caras. Meio a sopas instantâneas e barras de cereais, Ruth pergunta-a quem era o rapaz que interfonara de manhã perguntando por ela.



Devia ser o fruteiro, da banca da esquina.

Você encomendou alguma coisa?

Não, acho que não.

E por que ele interfonou, então?

Eu vou lá saber, Ruth? Por que você não o perguntou, hã? Seria mais fácil, ao invés de ficar me questionando.

Não estou... ah, hahahaha. Você acha que eu estou com ciúmes? Do fruteiro?




Desta vez, Ruth vestiu sua capa narcísica e berrou no corredor, quase vazio, como se precisasse fazer ecoar sua voz. Sarah deixou transparecer seu espanto frente à reação de Ruth, o que o fez 'baixar a guarda' e tentar consertar o que fez.


Desculpe, amor, mas eu não estou com ciúmes.. apenas quero saber o que ele queria, já que você não fez encomendas.

Sarah sentiu uma punhalada por saber que não presenciaria uma única fala de Ruth demonstrando ciúmes que ele mesmo poderia admitir. Ele era discreto, eventualmente pedia que Sarah colocasse roupas menos decotadas e gostava de abraçá-la quando homens passavam por eles, mas nunca dizia que sentia ciúmes; e, quando questionado sobre isto, ele desconversava. Seria uma dificuldade em assumir, tranquilamente, como qualquer pessoa sã e mortal que sentia ciúmes de sua parceira?
Segundo ele, ciúmes nós sentimos quando há reciprocidade no adultério, seja ele nem mesmo cometido no plano carnal, ou seja, mesmo quando um homem olhava para Sarah descaradamente, Ruth não sentia ciúmes, pois sabia que Sarah não retribuiria. Isto a deixava possessa.

Huhum..

Amor, não faz assim. Eu só perguntei se..

É Ruth, você só perguntou, como sempre. Só pergunta.

Você queria que eu pulasse no cara sem saber do que se tratava?

Ai, pára de ser criança.. você por acaso já sentiu ciúmes de mim?

Amor..esse papo de novo? Eu confio em você.

Sarah chora, e, como se tivessem tido uma longa discussão sobre, ela solta:

Acabou aqui, chega! Você vive a sua vida, e eu a minha.. se é pra eu ser apenas uma parte da sua vida, que você sequer se importa em não perder e demonstrar isso, então deu pra mim.

Amor..?

Sarah solta a cesta delicadamente no chão e sai, sem deixar rolar uma lágrima, dirigindo-se ao ponto de táxi.


Pra que ficar mordida de curiosidade em saber se ele foi ou não? Criatura, não seja tão instável.. qualquer um que te disser palavras ambíguas ou que mesmo queira ser seu amigo agora vai ser promovido à 'um cara que eu conheço, muito querido.. quem sabe rola' ?

Aprenda a dividir, little honey. Aprenda a dividir.

Completando a minha complexa contradição característica, trecho do livro mais bem escrito por MM.:

"(...)agora entendo que nunca estarei pronta, e que tudo o que preciso é conviver bem com meu desalinho e inconstância, que enfim aceito. Bom trabalho, doutor.".

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