domingo, 16 de agosto de 2009

O que eu faço dentro de mim?

Nenhum comentário. Mas isso não me deixa triste, nem aliviada em achar que isto não é frequentado. Existem muitas formas de se inteirar dos fatos sem dar a cara a tapa. Com sutileza e jogo de cintura a boa esperteza toma lugar dos meios tradicionais de comunicação e fala por alguém que não tem coragem de mostrar-se. Não é uma ofensa, mas se fosse, não seria problema. Eu também sou uma dessas. Depois de estudar os casos de alguns doentes mentais e consequentemente f'ísicos, percebe-se a aceitação do obscuro, do feio, até que se chegue na adoração camuflada dos sentimentos perversos e comportamentos 'antissociais'. Camuflados sim, doutores. Quando fazemos algo de errado, é notório o alívio ao sabermos que alguém fez o mesmo, de modo que sentimo-nos acompanhados na desgraça. Ficar sozinho não é um ponto forte dos humanos.
Vemos que aqui já se encaixa o velho dizer de que o homem não é uma ilha. Huxley, querido, obrigada pelas contribuições de suas obras, mas acho que neste momento desejo reverter meus comentários para outro aspecto.
Sentir-se aliviado pelo infortúnio alheio só porque sabemos que não somos os únicos é normal (deixemos as discussões de {a}normalidade para a Psicologia Social). Porém, arranjarmos a justificativa para tudo, admitindo que o mal faz parte da sociedade e portanto do homem e sua subjetividade pode ser nocivo. Deixe-me expressar melhor.

Susy se relaciona bem com as pessoas. Gosta de fazer novas amizades e é simpática, divertida. De uns tempos pra cá Susy vem se sentindo sozinha, como se o mundo andasse e a deixasse para trás. Depois de passar por uma crise financeira em seu orçamento e saber, por telefone, que um parente muito querido falecera, Susy entrou em depressão. Não apenas por isso, ela não conseguia se relacionar com rapazes, pois era muito insegura e não conseguia comprometer-se com nada. Após dois anos de análise, Susy parece ter melhorado sua percepção sobre o mundo e, principalmente, sobre si mesma. Ela tem problemas, tem frustrações e às vezes recai ao sofrimento por ter perdido pessoas que amava. Porém, seu luto é reforçado por sua força de vontade, conquistada e descoberta no decorrer destes dois anos, o que a faz sentir-se mais feliz e querida pelos que a cercam. O problema neste caso, colegas, é que Susy ainda sente-se solitária e não segue as 'recomendações' de seu analista: sair mais de casa, procurar conhecer pessoas em lugares novos, aventurar-se. Susy acha cômodo ficar em casa e não gosta de experenciar mais, pois sente medo de fracassar e sofrer novamente. Podemos diagnosticá-la facilmente e encaminhá-la à terapia, mas há um impasse comum neste quadro: Susy acha que está tudo bem. Ela admite que a condição humana é repleta de prazeres, pois somos programados para isto. Porém, devemos experimentar os dissabores de nossos próprios atos e aceitar que temos limitações, que podemos sim sofrer em casa, pois isto pode ser útil no futuro.

As observações finais podem ser usadas pelo terapeuta para que ele diga que ela deve experimentar os dissabores de seus atos, aventurando-se mais, mas Susy não o dá ouvidos e continua acreditando que ficar reclusa em sua redoma é mais confortável. O circo fechou quando ela reencontrou uma prima que não via há anos, numa festa de inauguração da galeria de arte perto de sua casa. Cátia, sua prima, disse-lhe que aprendeu a conviver com a tristeza depois que o marido a deixou. Em uma visão onisciente, Cátia vive com alguns gatos e só sai de casa para trabalhar como atendente de uma loja no shopping. Assim como Susy, ela não tem muitos amigos e não costuma frequentar lugares que a façam ter contatos demais, pois isto significaria um risco de ser deixada mais uma vez.
Enfim, Susy reforçou suas crenças de que não precisa procurar ajuda nem em si, nem nos outros, visto que Cátia vive 'bem', então ela poderia viver da mesma forma. Encerrou a terapia e toda a sua vida voltou-se para a adoração de sua condição de miséria emocional.

Pode ter sido um exemplo extenso para uma simples explicação, mas acho necessário que se coloque em vias prolixas, para que o resultado seja mais recheado.
Estou gorda? o que há demais? eu gosto de comer, há tantas pessoas gordas..
Estou sozinha? o que há demais? eu gosto de ficar sozinha, há tantas pessoas sozinhas..
e assim seguimos nos espelhando nos outros, nos seus infortúnios e perdendo a coragem para mudar a nossa condição.
É bom acomodar-se? Quem deve medir em uma balança um tanto subjetiva é quem se faz esta pergunta. Comodismo é diferente de Conformismo. Há uma tênue linha entre estas duas instâncias.

Perpassando os conhecimentos existencialistas e fenomenológicos, o que chamamos de destino pode sim ser um ingrediente a mais na receita de aceitar-se em sua condição e não fazer tanta questão de mudar por conta própria. Afinal de contas, quem rege o meu futuro? O locus de controle, neste caso, é externo, interno? Há de se pensar se o homem tem mesmo a condenação suposta de que é livre, de que pode responder pelos próprios atos e ser 'alvo' das consequências destes.
Então, colegas que permaneceram aqui até este presente momento, o que vocês me dizem? Somos livres e desempedidos para mudarmos nossas vidas, independente do que aconteça? Ou temos uma força que rege por nós, permitindo que, mesmo que mudemos nossas atitudes, nossa história já está traçada?

Carrasco de Mim

Já acreditei no destino
porque era cômodo para mim.
Saber que se não consegui ser capaz
não foi culpa minha, era pra ser assim.
Hoje que o destino não me banca
sou o sujeito das minhas escolhas
e responsável pelos meus fracassos.

Mas o destino me condenou
a ser meu próprio Carrasco.

( artista desconhecido )

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